
Falta de luz em São Paulo: por que o município não consegue romper o contrato com a Enel
Os fortes ventos que atingiram São Paulo na tarde de quarta-feira, 10 de outubro de 2024, com velocidades próximas a 100 km/h, provocaram um apagão ge...
Os fortes ventos que atingiram São Paulo na tarde de quarta-feira, 10 de outubro de 2024, com velocidades próximas a 100 km/h, provocaram um apagão generalizado que deixou quase 2,2 milhões de endereços sem energia elétrica na Grande São Paulo. Até o início da tarde de quinta-feira, 11, mais de um milhão de residências ainda enfrentavam a escuridão, expondo novamente as fragilidades do sistema de distribuição de energia na região. Esse episódio não é isolado: ele reacende o debate sobre a concessão da Enel, a empresa italiana responsável pelo serviço na capital e em municípios vizinhos, e os entraves para uma possível rescisão contratual. A crise, que mistura falhas técnicas, responsabilidades regulatórias e disputas políticas, custou bilhões ao comércio e aos serviços, segundo estimativas da Fecomércio, e coloca em xeque a gestão pública da energia no Brasil.

O Apagão de Outubro e Seus Impactos Imediatos
O blackout desta semana segue uma sequência de incidentes graves. Em setembro de 2023, chuvas intensas deixaram milhares sem luz por até uma semana em algumas áreas da capital. Já em outubro de 2024, o evento atual agravou a situação, com a Enel atribuindo parte dos problemas à falta de poda de árvores pela prefeitura — uma acusação que a administração municipal contesta veementemente. Na noite do apagão, a Prefeitura de São Paulo, por meio de sua Procuradoria Geral, notificou a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) exigindo explicações em até 48 horas sobre as causas do colapso.
Os prejuízos econômicos são alarmantes. A Fecomércio estima perdas de R$ 1,54 bilhão para o setor de comércio e serviços, afetando desde pequenos varejistas até grandes indústrias. Moradores relataram interrupções em serviços essenciais, como elevadores e sistemas de saúde domiciliar, enquanto o transporte público sofreu atrasos devido a falhas em semáforos. Essa recorrência de falhas não só compromete a qualidade de vida, mas também erode a confiança na concessionária, que opera desde 2018 na região metropolitana.
A Concessão da Enel e os Obstáculos Regulatórios
A concessão da Enel é gerida pela Aneel, uma autarquia federal vinculada ao Ministério de Minas e Energia. Diferentemente de serviços municipais, como saneamento ou transporte, a distribuição de energia elétrica é de competência federal, o que limita a intervenção direta da prefeitura. Para romper o contrato, seria necessário um processo administrativo rigoroso: investigação das causas dos apagões, análise de descumprimentos contratuais, garantia de contraditório e ampla defesa à empresa, e, por fim, um veredicto judicial ou regulatório.
- Etapas principais do processo: Abertura de inquérito pela Aneel, coleta de evidências técnicas (como relatórios de manutenção da rede), audiências públicas e possível aplicação de multas.
- Custos envolvidos: Uma rescisão antecipada poderia implicar indenizações bilionárias aos cofres públicos, financiadas por impostos, além de riscos de judicialização prolongada.
- Histórico da Enel: Desde a privatização em 2018, a companhia enfrentou críticas por investimentos insuficientes em infraestrutura, apesar de faturamento anual na casa dos bilhões de reais.
Esses entraves regulatórios explicam por que, apesar das promessas de melhorias, os apagões persistem, frustrando tanto a população quanto as autoridades locais.
A Guerra Política por Trás da Crise Energética
Desde 2023, a questão da Enel transformou-se em uma arena política entre direita e esquerda. O prefeito Ricardo Nunes (MDB), alinhado a uma gestão municipal conservadora, cobra publicamente do governo federal ações concretas, como a revisão da concessão ou a imposição de sanções mais duras. Em contrapartida, representantes do governo Lula apontam que a diretoria da Aneel foi nomeada durante gestões anteriores, insinuando responsabilidade compartilhada. Essa polarização ganhou fôlego com as eleições municipais de 2024, onde falhas no fornecimento de energia viraram munição para opositores.
Especialistas em regulação energética destacam que, além da disputa ideológica, há falhas sistêmicas: a rede de distribuição em São Paulo é uma das mais antigas do país, com cabos aéreos vulneráveis a intempéries climáticas cada vez mais intensas devido às mudanças climáticas. Propostas de transição para redes subterrâneas ou energias renováveis distribuídas esbarram em custos elevados e falta de consenso político.
Conclusão: Rumos para uma Solução Sustentável
A crise com a Enel em São Paulo ilustra os desafios da privatização de serviços essenciais no Brasil: eficiência versus accountability. Enquanto o processo para romper o contrato parece distante, urge uma abordagem integrada, com investimentos em infraestrutura resiliente e maior cooperação entre esferas de governo. Sem isso, novos apagões ameaçam não só a economia, mas a estabilidade social da maior metrópole do país. A população paulistana merece luz — literal e figurativamente — sobre o futuro de sua energia.




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