
STF Reconhece Racismo Estrutural Contra Negros, Mas Não Vê Omissão do Estado
Em um marco histórico para a luta contra a desigualdade racial no Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, por unanimidade, a existência d...
Em um marco histórico para a luta contra a desigualdade racial no Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, por unanimidade, a existência do racismo estrutural que afeta sistematicamente a população negra. A decisão, proferida em julgamento realizado na quinta-feira, 18 de outubro de 2024, destaca as violações contínuas de direitos fundamentais e impõe ao governo federal a elaboração de um novo plano nacional de combate à discriminação racial, com prazo de até 12 meses. Essa medida surge em meio a um contexto de profundas desigualdades sociais, onde o racismo não é mero incidente isolado, mas uma estrutura enraizada nas instituições do país.

Medidas Prioritárias para Combater o Racismo Estrutural
O STF determinou uma série de ações concretas para enfrentar o problema. No âmbito da segurança pública, a Corte enfatizou a necessidade de reduzir a letalidade policial, que desproporcionalmente vitima negros. Dados alarmantes do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) revelam que, apenas em 2024, 3.066 pessoas negras foram mortas pela polícia em todo o território nacional, representando 86% do total de vítimas. Essa disparidade reflete um padrão de violência institucional que perpetua o ciclo de marginalização.
Além disso, o plano nacional deve incluir políticas específicas para combater a fome entre a população negra. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 70% das famílias brasileiras em situação de insegurança alimentar são chefiadas por pessoas pretas ou pardas. Na área da saúde, intervenções urgentes são exigidas, uma vez que a desigualdade econômica expõe negros a maiores riscos de mortalidade por doenças como tuberculose e desnutrição, diretamente ligadas à pobreza crônica.
Políticas de Cotas e Contexto Legislativo Recente
Outra determinação crucial do STF é a manutenção e revisão das políticas de cotas raciais em educação e emprego. A Corte identificou a necessidade de aprimorar metodologias que se mostraram pouco efetivas, garantindo maior impacto na inclusão social. Essa decisão ganha relevância uma semana após a Assembleia Legislativa de Santa Catarina aprovar uma lei que proíbe reservas de vagas em universidades estaduais com base em critérios de cor ou raça, medida que contraria avanços nacionais e pode ser questionada judicialmente.
O racismo estrutural, conforme definido pelo relator Luiz Fux, manifesta-se em desigualdades persistentes em acesso a direitos básicos, como moradia, educação e justiça. Os dez ministros presentes na sessão — com uma vaga ainda aberta na Corte — seguiram integralmente o voto de Fux, reforçando a responsabilidade do Estado em mitigar essas injustiças históricas.
Ação Judicial e Limites da Decisão
A decisão atende a uma Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) ajuizada em 2022 por sete partidos de esquerda: PT, PSOL, PSB, PCdoB, Rede Sustentabilidade, PDT e PV. Os autores argumentaram pela existência de um "estado de coisas inconstitucional" devido às violações sistemáticas de direitos das pessoas negras. No entanto, o STF rejeitou esse pedido específico, entendendo que não há omissão deliberada do Estado, mas sim a necessidade de ações mais robustas e coordenadas.
Essa distinção é crucial: enquanto o reconhecimento do racismo estrutural abre portas para responsabilização, a negativa de omissão estatal evita uma declaração mais drástica que poderia paralisar políticas públicas. Especialistas em direitos humanos veem na decisão um avanço, mas alertam para a importância de sua implementação efetiva, monitorada pelo Judiciário.
Conclusão: Um Passo Rumo à Igualdade Real
A decisão do STF representa um divisor de águas na agenda de equidade racial no Brasil, um país marcado por séculos de escravidão e herança colonial. Ao impor um plano nacional abrangente, a Corte não apenas diagnostica o problema, mas exige soluções práticas em áreas críticas como segurança, saúde e educação. Contudo, o sucesso dependerá da vontade política do governo federal e da sociedade civil para transformar palavras em ações concretas. Em um momento de polarização, essa medida reforça o compromisso constitucional com a dignidade humana, pavimentando o caminho para um Brasil mais justo e inclusivo. A expectativa é que, em 12 meses, vejamos os primeiros frutos de um combate efetivo ao racismo estrutural.





