Antigo Prédio do Dops: Símbolo de Tortura na Ditadura Militar é Tombado como Patrimônio Cultural
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Antigo Prédio do Dops: Símbolo de Tortura na Ditadura Militar é Tombado como Patrimônio Cultural

Em um marco histórico para a preservação da memória brasileira, o antigo edifício que abrigou o Departamento de Ordem Política e Social (Dops) no Rio...

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Em um marco histórico para a preservação da memória brasileira, o antigo edifício que abrigou o Departamento de Ordem Política e Social (Dops) no Rio de Janeiro foi oficialmente tombado como patrimônio cultural pelo governo federal. Local de torturas, prisões arbitrárias e mortes durante a ditadura militar (1964-1985), o prédio representa um capítulo sombrio da repressão política no Brasil. A decisão, publicada no Diário Oficial da União em 30 de novembro, foi assinada pela ministra da Cultura, Margareth Menezes, e reforça o compromisso com a justiça de transição e a educação sobre os horrores do regime autoritário.

Situado na Rua da Relação, 40, no centro da capital fluminense, o edifício funcionava como a Repartição Central de Polícia e se tornou sinônimo de terror para opositores do regime. Milhares de pessoas, incluindo estudantes, intelectuais e militantes de esquerda, passaram por suas celas, onde sofreram interrogatórios brutais e violações de direitos humanos. O tombamento não apenas protege a estrutura física, mas também garante que sua história seja contada às futuras gerações, evitando o esquecimento de um passado que ainda ecoa na sociedade brasileira.

A História Sombria do Prédio e do Dops

O Departamento de Ordem Política e Social foi criado em 1927, mas ganhou notoriedade durante a ditadura militar, atuando como braço repressivo do Estado. No Rio de Janeiro, o Dops era responsável por vigiar, prender e interrogar suspeitos de subversão, especialmente aqueles acusados de comunismo ou de participação em guerrilhas urbanas. O "porão do Dops", como era conhecido o subsolo do edifício, era um centro de tortura onde métodos como choques elétricos, espancamentos e afogamentos simulados eram rotina.

Figuras icônicas da resistência, como o ex-deputado Carlos Marighella, assassinado em 1969, e Rubens Paiva, desaparecido em 1971, tiveram ligações diretas com as operações do Dops. Relatórios da Comissão Nacional da Verdade, instituída em 2012, documentaram centenas de casos de abusos nesse local. Familiares de vítimas relatam que muitos presos políticos nunca mais foram vistos, sendo exilados, executados ou "desaparecidos" pelo regime. Essa herança de violência deixou cicatrizes profundas, com impactos psicológicos e sociais que persistem até hoje.

Fachada do antigo prédio do Dops no Rio de Janeiro, tombado como patrimônio cultural

O prédio, construído no século XIX, já abrigava a polícia civil antes da ditadura, mas foi sob o regime militar que se transformou em um símbolo de opressão. Historiadores enfatizam que preservar esse espaço é essencial para compreender como o Estado usou a violência para silenciar dissidentes, afetando não só indivíduos, mas a democracia como um todo.

O Processo de Tombamento e sua Importância

O tombamento esteve em discussão no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) por mais de uma década, mas avançou significativamente após uma reunião em 26 de novembro. Participaram conselheiros do Iphan, familiares de vítimas como os de Marighella e Paiva, e ex-presos políticos, incluindo professores universitários que sobreviveram às prisões. Essa deliberação coletiva destaca o papel da sociedade civil na preservação da memória histórica.

De acordo com o Iphan, o tombamento protege o edifício de demolições ou reformas que apagassem sua história, permitindo visitas guiadas e exposições educativas. Especialistas em patrimônio cultural argumentam que locais como esse funcionam como memoriais vivos, semelhantes ao Memorial da Resistência em São Paulo, que também foi um antigo Dops. A medida federal alinha-se a leis como a de 2014, que criminaliza a apologia à ditadura, reforçando a narrativa oficial de reparação às vítimas.

O Renascimento Cultural e o Impacto do Cinema

O recente interesse pelo tema foi impulsionado pelo filme Ainda Estou Aqui (2024), dirigido por Walter Salles, que reconta a história da família Paiva após o desaparecimento de Rubens. Vencedor do Oscar de Melhor Filme Internacional em 2025, o longa-metragem trouxe visibilidade global às violações da ditadura, com Fernanda Torres ganhando um Globo de Ouro por sua interpretação de Eunice Paiva, a viúva resiliente que lutou por justiça.

As ações se intensificaram no final de 2023, quando o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ordenou a revisão de certidões de óbito de vítimas da ditadura, incluindo "violência pelo Estado" como causa oficial. Esse movimento judicial, aliado ao sucesso cinematográfico, pressionou o governo a acelerar o tombamento. Críticos culturais veem nisso uma oportunidade para debates sobre direitos humanos, com o prédio podendo se tornar um museu ou centro de estudos.

Ícone simbólico representando memória e justiça histórica
  • Benefícios do tombamento: Preservação arquitetônica e educacional.
  • Desafios: Garantir acesso público sem romantizar a violência.
  • Conexões globais: Similar a memoriais de regimes autoritários em outros países, como o Tuol Sleng no Camboja.

Em conclusão, o tombamento do antigo Dops é um passo crucial para confrontar o passado e construir um futuro mais justo. Ao transformar um local de dor em espaço de reflexão, o Brasil honra suas vítimas e reafirma o valor da democracia. Iniciativas como essa não só educam, mas também previnem que horrores semelhantes se repitam, garantindo que a memória coletiva permaneça viva e acessível.

Símbolo de preservação patrimonial e direitos humanos
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