Brasil se abstém de assinar comunicado do Mercosul sobre Venezuela: entenda as razões
Política5 min de leitura843 palavras

Brasil se abstém de assinar comunicado do Mercosul sobre Venezuela: entenda as razões

Em um momento de tensão diplomática na América do Sul, o Brasil optou por não assinar o comunicado conjunto do Mercosul que exige a "restauração da de...

Compartilhar:

Em um momento de tensão diplomática na América do Sul, o Brasil optou por não assinar o comunicado conjunto do Mercosul que exige a "restauração da democracia" na Venezuela. A decisão, tomada durante a cúpula do bloco em Foz do Iguaçu (PR), reflete divergências profundas entre os países membros, especialmente sob as lideranças de Luiz Inácio Lula da Silva, no Brasil, e Javier Milei, na Argentina. Enquanto Milei defende uma postura mais alinhada às pressões externas, como as dos Estados Unidos sob Donald Trump, Lula alerta para os riscos de uma "catástrofe" na região. Essa episódio destaca as fragilidades do Mercosul e as complexidades da política externa brasileira em relação ao vizinho bolivariano.

Contexto da Cúpula do Mercosul e a Iniciativa Argentina

A cúpula do Mercosul, realizada em dezembro de 2023 em Foz do Iguaçu, reuniu líderes dos países membros para discutir integração econômica e questões regionais. No entanto, a agenda foi dominada pela crise política na Venezuela, sob o governo de Nicolás Maduro. A Argentina, liderada pelo presidente ultraliberal Javier Milei, assumiu a presidência pro tempore do bloco e impulsionou a emissão de um comunicado crítico ao regime venezuelano.

O documento final, assinado por Argentina, Paraguai e Brasil (este último de forma parcial, mas sem adesão total), condena violações aos direitos humanos e a crise humanitária no país vizinho. Milei, alinhado ideologicamente com figuras como Donald Trump, defendeu uma abordagem de pressão internacional, incluindo sanções e intervenções. "A democracia na Venezuela precisa ser restaurada urgentemente", declarou o presidente argentino durante o evento, ecoando preocupações globais sobre eleições fraudulentas e repressão política em Caracas.

Fontes do Itamaraty revelam que negociações sobre o texto vinham ocorrendo há semanas. O Brasil, historicamente defensor de uma política externa independente, buscava um equilíbrio que condenasse os abusos internos na Venezuela, mas também criticasse interferências externas na região.

Cúpula do Mercosul em Foz do Iguaçu, com líderes discutindo a Venezuela

A Posição Brasileira e as Divergências nas Negociações

O governo Lula aceitava pontos do comunicado relacionados aos direitos humanos e à crise humanitária, agravada pela hiperinflação, escassez de alimentos e êxodo em massa de venezuelanos. No entanto, o Brasil insistia na inclusão de um parágrafo que alertasse para a "grave ameaça à soberania regional" representada pela presença militar dos Estados Unidos no Caribe. Essa referência indireta criticava ações americanas, como o envio de navios de guerra, caças e até um submarino nuclear desde agosto de 2023, além de confisco de petroleiros venezuelanos e bombardeios de barcos na área.

Interlocutores do Ministério das Relações Exteriores afirmam que os demais membros do Mercosul rejeitaram essa inclusão, vendo-a como uma concessão excessiva ao regime de Maduro. Diante do impasse, o Brasil se ausentou da redação final do texto, seguido pelo Uruguai, que também não assinou. Um diplomata brasileiro, sob condição de anonimato, lamentou: "Sabíamos que eles prosseguiriam com o documento. É um direito deles. Mas, como nossa posição era conhecida, não fomos consultados sobre a linguagem final. Lamentamos a ausência do tradicional comunicado conjunto de Estados Partes e Associados."

Essa decisão reflete a visão de Lula de evitar alinhamentos automáticos com potências externas. O presidente brasileiro já havia alertado para os perigos de uma escalada militar, chamando-a de "catástrofe" para a estabilidade sul-americana. Em discursos recentes, Lula enfatizou a necessidade de soluções pacíficas e multilaterais, contrastando com a retórica intervencionista de Milei.

Implicações Diplomáticas e Reações Internacionais

A abstenção brasileira expõe fissuras no Mercosul, criado em 1991 para promover o comércio e a cooperação, mas frequentemente paralisado por divergências ideológicas. O bloco, que inclui Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai (com Venezuela suspensa desde 2016), enfrenta desafios adicionais com a presidência de Milei, que questiona até a existência do Mercosul em sua forma atual.

No cenário internacional, a posição do Brasil pode ser interpretada como uma defesa da multipolaridade, resistindo às pressões dos EUA. Washington, sob Trump, intensificou sanções contra Maduro, incluindo bloqueios econômicos que afetam o petróleo venezuelano — principal fonte de receita do país. Críticos argumentam que essas medidas agravam a crise humanitária, enquanto apoiadores veem-nas como necessárias para forçar mudanças democráticas.

  • Impacto humanitário: Mais de 7 milhões de venezuelanos fugiram do país desde 2015, muitos buscando refúgio no Brasil, especialmente em Roraima.
  • Relações bilaterais: O Brasil mantém relações diplomáticas com a Venezuela, mas com canais limitados devido às tensões.
  • Perspectivas futuras: Analistas preveem que o episódio pode enfraquecer a coesão do Mercosul, beneficiando fóruns alternativos como a Unasul ou a CELAC.
Líderes do Mercosul, incluindo Lula e Milei, na cúpula de Foz do Iguaçu

Questionado sobre o episódio, o Itamaraty optou pelo silêncio oficial, priorizando canais diplomáticos discretos.

Conclusão: Um Equilíbrio Delicado na Diplomacia Sul-Americana

A recusa do Brasil em assinar o comunicado do Mercosul sobre a Venezuela ilustra os dilemas da diplomacia contemporânea na América do Sul. Enquanto o bloco busca unir forças contra autoritarismos, as visões contrastantes sobre soberania e intervenção externa criam obstáculos. Lula's abordagem equilibrada busca preservar a autonomia regional, mas corre o risco de isolar o Brasil em um momento de crescente polarização global. À medida que as tensões no Caribe persistem, o futuro das relações entre Brasil, Venezuela e seus aliados dependerá de diálogos que transcendam ideologias, promovendo estabilidade e direitos humanos sem comprometer a paz continental.

Mapa da América do Sul destacando Mercosul e tensões na Venezuela
Categorias:Política

Últimos Posts